Esses dias estudei o modelo argentino de saúde, talvez o mais fragmentado da América Latina, formado por assistência pública, privada e uma seguridade social destinada aos empregados. Com bastante regionalização das políticas.
Chamou atenção o conceito do Obras Sociales, que atende cerca de 60% da população, correspondente àqueles com registro de emprego. Esse sistema é gerido por entidades representativas dos trabalhadores, que gerenciam serviços de medicina privada. Não propicia acesso perfeito, mas me pareceu melhor que o público. Os usuários são satisfeitos. Reclamam que os equipamentos são mais velhos que nos planos puramente privados, mas o atendimento é bom.
De toda forma, o sistema argentino resolve o problema de 60% dos Hermanos, restando cerca de 28% para ser atendido no público. No Brasil, o SUS tenta responder pela atenção a 75% da população. Acorda, Alice, isso não dá certo!
O desejo sanitarista de atender, universalmente e integralmente, 100% do povo brasileiro no SUS tem ficado cada vez mais distante. Tal conceito estadista mostra-se ultrapassado. Os adeptos do privado aumentam a cada dia, dada a impossibilidade do Público atender tanta gente.
Todavia, mesmo crescendo, constato que o modelo brasileiro de planos de saúde também já não agrada a uma maioria.
Quando a regulação impôs nova realidade aos planos individuais, desde 1998, os operadores passaram a preferir os contratos coletivos. Dizem que a conta dos contratos com pessoas físicas não fecha.
Por outro lado agora, com mais de 80% dos planos no Brasil sendo coletivos, a sociedade não está aceitando as regras desse modelo, que permitem cancelamento unilateral e reajuste livre.
O que fazer? Regular os planos coletivos como individuais? Claro que não, pois já está provado que os operadores não vão vender produtos que consideram inviáveis. É que a proteção ao consumidor deu espaço também ao oportunismo de alguns prestadores e, assim, as fraudes e os exageros inviabilizaram o equilíbrio da relação. O que se vê é uma onda de suspensão voluntária da oferta de planos.
Uma solução adequada de mercado não passa necessariamente pela imposição. O atendimento universal, integral, mundial, continental, sobrenatural, não funcionou no Sistema Público e não vai funcionar no Privado, por mais impositiva que a lei venha ser.
Passou da hora de diminuir o peso da regulação e permitir alternativas de subsídios da assistência a saúde. Existem várias, e algumas muito interessantes, que mesclam público e privado, assim como uma auto gestão de políticas sociais de saúde. Mas é preciso reconhecer a necessidade de novas experiências. Por que não franquia? Por que não planos mais enxutos? Por que não sistemas por categorias? Há de se permitir experimentar.
Esses novos modelos só são possíveis com uma regulação equilibrada. Pela força da lei de hoje, continuaremos andando em círculos: obriga-se a uma coisa e todos fogem dela.
Para mais detalhes, deixe sua dúvida ou observação e use o chat do Justiça e Saúde.
Elano Figueiredo, autor do artigo, é ex-diretor da ANS e especialista em sistemas de saúde. Assina esse conteúdo como Fundador do Justiça e Saúde.
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