Em 2018, escrevi um artigo sobre os crescentes diagnósticos do Transtorno do Espectro Autista - TEA. A curva de novas ações judiciais sobre o tema chamava atenção.
Hoje, com as pesquisas sobre os custos dos tratamentos para esses pacientes, revisitei o texto e percebi que ele continua mais atual que nunca. Republiquei. Vale a pena conferir.
Mas o que me motivou a escrever novamente a esse respeito foi o anúncio de que as despesas com TEA superaram as de câncer.
Aqui, não pretendo debater os desvios assistenciais (fraudes), que estão presentes e contaminam negativamente tanto as estatísticas de TEA, como de oncologia. Independente disso, o momento é de encarar de frente as realidades de cada uma das patologias comparadas, para entender o futuro que nos aguarda.
Então, vamos usar a lógica.
De um lado, o tratamento de câncer se moderniza bastante, com a incorporação de quimioterápicos orais, cada vez mais potentes. Eles não são baratos, mas reduzem significativamente os custos hospitalares. Muitos curam.
De outro lado, as terapias para os pacientes do espectro estão mais baseadas no esforço dos profissionais das áreas de neurologia, psiquiatria, psicologia, fisioterapia, terapia ocupacional, entre outras. A medicação pode ser importante, mas impacta secundariamente nos custos – geralmente assumida de forma particular pelos pais.
Estatisticamente, o câncer atinge pessoas de idade mais avançada. Mesmo com o diagnóstico cada vez mais frequente para a faixa entre 15 a 39 anos (Unidade de Oncologia de Adolescentes e Jovens Adultos no Reino Unido), sua incidência é mais comum em indivíduos a partir de 60 anos.
Não esquecer também de que há menos subjetividade no diagnóstico oncológico, porque os exames de imagem e de patologia são capazes de atestar a malignidade.
Já o TEA, além de demandar mais atenção em relação ao público de crianças e adolescentes, apresenta elementos empíricos a serem analisados, exigindo ainda muita pesquisa e amplitude nos tratamentos.
Com efeito, os métodos utilizados para o melhor desenvolvimento dessa população jovem vêm surtindo efeitos comprovados, o que implica no reconhecimento da importância de sua aplicação cada vez mais precoce. Fraudes à parte, aqueles que efetivamente estão no espectro atingem uma qualidade de vida melhor – e não vão abrir mão dela.
Já disso, é possível entender a minha linha de pensamento: enquanto o tratamento oncológico tem uma duração menor, porque utilizado para uma média de pessoas de faixa etária mais avançada, o apoio ao TEA acompanha o indivíduo pela vida inteira, desde muito novo.
Ainda mais, parte dos tumores malignos têm cura, enquanto o transtorno autista vai demandar atenção especial sempre.
Portanto, não deveria ser surpresa os custos com assistência ao TEA impactarem os planos de saúde tanto ou mais que os tratamentos oncológicos. O melhor diagnóstico das crianças no espectro obviamente levaria a isso, à necessidade de apoio de profissionais da saúde por um período mais longo.
Então, o desafio não é constatar esses números, mas sim criar produtos, pacotes de saúde e meios suficientes a enfrentar a nova realidade, de pacientes saudáveis, em alguma linha do espectro, que precisam de um acompanhamento não tão oneroso, mas constante. Eis a nova equação que a saúde precisa explorar.
Texto publicado em 2018, por Elano Figueiredo, ex-diretor da ANS, advogado, especialista em sistema de saúde e health speaker.
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