Sou contra a revisão técnica (esse é o nome correto do novo tipo de reajuste que se pretende regulamentar), se for pensada de maneira indiscriminada. Acho que ela deve ser uma ferramenta de último recurso, a ser utilizada apenas em situações de evidente desiquilíbrio de uma carteira e que ponha em risco a própria continuidade do plano de uma coletividade (número expressivo de beneficiários).
Ainda assim, sou mais contra ainda que se divulgue desinformação.
Acontece que, nesse fim de semana, os veículos mais importantes do país trouxeram uma manchete capaz de incitar o aparecimento de outros como Luigi Mangione, aqui no Brasil. Uma forma de entregar a notícia instigando o ódio contra as operadoras e contra o órgão regulador. Não é bacana.
O título é “ANS cogita autorizar mais de um reajuste para planos de saúde”. Não é bem assim. Aliás, não é nada assim.
No direito, situações supervenientes, imprevisíveis no momento da celebração do contrato, podem sim ensejar a necessidade de revisão e renegociação do pacto.
Vamos a uma situação bem prática: o avanço do diagnóstico de TEA e o custo das novas terapias.
Quando se calculava o preço dos planos de saúde em 2010, ninguém era capaz de prever que o custo de uma criança superaria o de um idoso, em 2022. Mas aconteceu e não se pode dizer que faz parte do risco do negócio, porque esse risco não existia à época.
Entretanto, isso não significa dizer que todos os planos de saúde da população mais jovem devem ser revisados; mas alguns que foram fortemente impactados e comprometeram sistemicamente a operação de saúde sim.
Além disso, defendo que a medida deve passar por investigação da responsabilidade pessoal dos administradores da operadora, porque existiu muito Diretor Comercial que baixou o preço de venda para gerar mais comissão e comprometeu a sustentabilidade da carteira hoje.
Então, a verdade é que o regulador de planos de saúde tem um "abacaxi" enorme nas mãos. Operadoras pequenas quebrando em razão de fatores imprevisíveis de custo. Isso precisa sim ser debatido. Ao que se indica, está na pauta da reunião colegiada de hoje, na ANS.
Não sei se é o melhor momento. Antigo presidente saindo. Novo presidente anunciado. Resultado do 3º trimestre demonstrando uma melhora importante dos resultados do setor.
Mas, de toda forma, a notícia nunca deve ser passada de uma forma a incitar o ódio, a aumentar a assimetria da informação da saúde. É como penso.
Elano Figueiredo é ex-diretor da ANS, especialista em sistemas de saúde e fundador do Portal JS.
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