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O trabalho e a principal entrega em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está em xeque, de forma inesperada e por uma das suas maiores virtudes: O Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde.
De forma diversa as regulações de mercado em geral, o cerne da política pública expressa nas duas Leis mais importantes para o marco regulatório da saúde suplementar no país, Lei 9659/98 e Lei 9961/00, foi, e é, a regulação dos produtos, no caso planos de saúde.
A regulação é muito maior que a regulação dos planos: tem aspectos econômico-financeiros, ressarcimento ao SUS, de monitoramento e fiscalização e outras dimensões do setor. Mas o principal foco é a saúde, são os planos e sua forma de operação. E qual o compromisso dos planos? De forma singela pode- se dizer: é entregar, no mínimo e na medida da necessidade, toda a cobertura prevista no Rol de Procedimentos da ANS. O Rol de Procedimentos diz o que todos os contratos têm que cobrir obrigatoriamente, independente de ainda poderem haver coberturas adicionais contratas, como assistência farmacêutica, transporte em UTI aérea e outras – esclarecendo: o rol é uma lista.
Se você antes de 1999 fosse diagnosticado com um transtorno psiquiátrico ou a descoberta de um câncer, provavelmente você estaria sem atendimento pelo seu plano. Agora não: estão cobertos.
Mas afinal, o que é “cobertura” de um plano? São os procedimentos: exames, consultas, cirurgias etc. que você tem direito de ter. E essa lista (o rol) de procedimentos, permanentemente atualizada, vale para todos os contratos assinados após 02/01/1999. Pois então: se o seu contrato foi assinado entre 1999 e hoje, está valendo a última atualização do rol, feita em 2021.
Ficou em dúvida se o exame, consulta etc. são cobertos? Consulte a página da ANS e/ou ligue 08007019656 e tire sua dúvida. Simples assim.
Desta forma a missão da ANS, expressa em lei, está sendo cumprida: melhorar a saúde dos brasileiros que contratam planos de saúde, e assim também colaborar para a melhora da atenção a saúde em geral. Essa é a visão, inclusive expressa em lei. De outra forma: se você já tem plano e entram novos procedimentos no Rol, você passa a ter direito também. Uma verdadeira revolução em um mundo em que cada contrato definia sua lista de cobertura. E entendemos também que o processo de análise de incorporação tecnológico precisa de agilidade, e vendo sendo atualizado.
Mas, vale lembrar, que estamos regulando um mercado privado – e em que a operadora precisa fazer o preço de seu produto/ plano com base no que irá ter que se responsabilizar e pagar. Inclusive com cálculos atuariais para provisão de pagamento de eventos de maior complexidade ou maior custo, que não estavam previstos nos cálculos básicos feitos para vender o plano.
Enfatizemos o que representa um plano de saúde: um conjunto de serviços a ser prestado aos consumidores, incluídos aí coberturas de grandes riscos futuros - tanto para a saúde quanto para os preços dos planos. Obrigatoriamente é calcado no rol/lista de procedimentos em saúde atualizada pela ANS.
O cálculo para que se baseie o preço de um plano, usando lista de exemplos, em que qualquer cobertura possa a vir a ser exigida, é impossível. Como aliás qualquer produto ou serviço. Mesmo sabendo que qualquer comparação com saúde é fraca na origem, peço a compreensão. Imagine você entrar em um supermercado, pagar um preço x na entrada, e poder colocar no carrinho qualquer produto das prateleiras, em qualquer quantidade e variedade. De tudo. Legumes, carne, frutas e verduras, eletrodomésticos a venda etc. Isso é impossível, não é? É a mesma coisa com um plano. Um rol/lista exemplificativa vai criar o supermercado da ilusão.
O plano de saúde tem um Rol de Procedimentos mínimo e obrigatório vasto, mas definido. Fica fácil entender a importância desta lista de mais de 3.000 procedimentos. Coberturas que eram raras em antes das leis e da ANS passaram a ser incluídos. Vamos usar o exemplo do ano de 2019: procedimentos como ressonância magnética e tomografia, estas com mais de 6.3 milhões e 7.3 milhões de procedimentos foram realizados em 2019, para pessoas que tem plano.
Continuando: em 2.000 o Rol só apontava a cobertura de 12 sessões de psicoterapia breve. Essa era toda a psicoterapia coberta. Já em 2019 foram cobertas 19.325.222 sessões de psicoterapia. Mais de dezenove milhões.
No mesmo ano: fisioterapia, mais de 34 milhões de consultas/sessões; fonoaudiologia, mais de 5.5 milhões de consultas/sessões; nutrição, mais de 2 milhões de consultas; terapia ocupacional: mais de 2 milhões de consultas.
Para alguns transtornos especiais, o Rol cobre um número ilimitado de consultas/sessões: é o caso dos Transtornos Globais de Desenvolvimento em que o número de sessões com fonoaudiólogos, psicoterapeutas e terapeutas ocupacionais. Ilimitado. No entanto a ANS sempre evitou nomear o método a, b ou c de tratamento. Isso cabe aos profissionais e seus conselhos, não à ANS.
Esse dispositivo que garante aos consumidores cobertura dessa magnitude está para acabar. Inacreditavelmente. Pois acabar com o rol mínimo obrigatório de coberturas, tornando-o meramente exemplificativo, poderá ensejar três consequências, não excludentes: 1. todos os preços de planos com cobertura médico-hospitalar deverão subir imediatamente de preço nas prateleiras - pois não haverá referência do custo daquele plano; 2. Os contratos serão somente para o pacote de procedimentos acertado NO MOMENTO do contrato, não sendo mais garantidos ao consumidor/paciente todos os procedimentos hoje no Rol; 3. A lista de procedimentos cobertos ficará atreladas ao contrato de cada um, deixando de ser atualizada. Isso pois o rol será uma mera lista de exemplos, perdendo sua finalidade.
Isto é, vamos retroceder ao que ocorria antes de 1998. Onde não havia regulação de planos. Não se deixem enganar: a maior defesa dos consumidores para exigir a cobertura mínima obrigatória é o Rol de Procedimentos. Do jeito que ele é hoje. Sua cobertura mínima é TAXATIVA e eventuais novas coberturas não listadas no rol, podem ser estipuladas em cláusulas específicas negociadas no contrato
Mas o essencial foi e é garantido pelo Rol de Procedimentos da ANS. Taxativo, mínimo e obrigatório. Foi uma conquista da Sociedade Brasileira e seu Congresso Nacional. Não é razoável que passemos a viver com o pesadelo do passado, como nosso futuro.
Hoje todos os consumidores/ pacientes estão protegidos. Independente se são operários, gerentes ou diretores – pode variar o padrão de conforto, mas a lista (ou rol) é a mesma. Os deveres para o atendimento são os mesmos. Isso é a dimensão do que se pode estar jogando fora se o Rol de Procedimentos for considerado uma lista exemplificativa somente. Um retrocesso que irá custar caro a todos, na medida que um dos alicerces da política pública de saúde desapareceria.
Exemplificativo NÃO. Queremos nossos direitos preservados.
Joao Barroca
Médico
Assessor PRESI ANS
Ex-Diretor da ANS (2000/2003)
*esse texto representa exclusivamente a opinião do autor.
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